O entulho protecionista
Eis-me de volta ao “Jornal Pequeno”, depois de tanto tempo. Eu
não estreio hoje neste jornal. Estreio de novo, pois fui um dos colaboradores da
Página da Juventude, dirigida, aí por volta de 1966, por meu grande amigo
Carlos Nina, notável advogado, ex-presidente da OAB-MA e líder de um grupo de
entusiasmados jovens mal saídos da adolescência, dispostos a se arriscarem no
mundo das letras. Éramos, além dele, Aldir Dantas, Viriato Gaspar, João
Alexandre Viegas Costa Júnior, meu colega do Colégio Marista, bem como Lucideia
Oliveira e Regina Teles.
Desta vez, foi o poeta Cassas quem me sugeriu o retorno e se
deu o trabalho de falar com Vinicius Bogéa, que, por sua vez franquiou o jornal
à minha colaboração. Muito obrigado a todos.
Não, não guardei nada publicado naquela época. Fiz bem.
O JP me desperta memórias afetivas de minha avó, Marcelina
dos Santos Raposo. Foi seu hábito comprar infalivelmente, durante décadas,
diariamente, o “Jornal Pequeno”, que ela lia com verdadeiro prazer. Também todo
dia, fazia sua fezinha no jogo do bicho, perto de onde morávamos, em frente ao
SENAI, no Monte Castelo. Ao pensar no JP, sempre penso também nela. E
vice-versa.
A seguir o texto desta semana.
A chamada PEC das blusinhas tratava inicialmente do Programa de Mobilidade Verde e Inovação – MOVER,
de incentivo fiscal à produção de veículos não poluentes. A ela foi
acrescentado, quando a PEC chegou ao Congresso, o jabuti da taxação das compras
na internet de produtos de outros países, com preço até 50 dólares. O contrabando
trouxe de volta à vida polêmica velha de décadas, acerca da conveniência ou não,
para a economia brasileira, da criação de barreiras alfandegárias contra
produtos estrangeiros provenientes de diversos países, entre eles a China.
Qual a justificativa para mais esse imposto sobre os já
excessivamente tributados contribuintes do guloso fisco brasileiro? Dizem seus
defensores: 1) Esses produtos chegam aqui a preços competitivos porque recebem
subsídios de seus governos, o que os torna mais baratos comparados com os do Brasil;
2) A receita tributária extra assim gerada para os cofres do Estado brasileiro será
utilizada com o fim de equilibrar as contas públicas, medida tão necessária no
combate à inflação; 3) A taxa das blusinhas seria temporária, a vigorar apenas
pelo tempo das empresas nacionais crescerem e se capacitarem a enfrentar a
concorrência externa, sem dependerem do poder público.
Há várias décadas, eu ouço tais argumentos. Já vão mais de
cinquenta anos e a indústria nacional, beneficiária desse entulho
protecionista, não é capaz de competir com os produtores externos, sem favores
do governo.
Vejamos a seguir os argumentos protecionistas mais de perto.
SUBSÍDIOS CONCEDIDOS PELO GOVERNO DA CHINA AO PRODUTOR
CHINÊS –Quando a PEC chegou ao Congresso Nacional, houve concordância geral
sobre a necessidade de aprová-la no. Aí colocaram lá o tal jabuti, ou seja,
medida estranha ao assunto da PEC. Dizia-se que, se o governo da China concedia
benefícios fiscais às empresas de lá, então o Brasil não só poderia, como seria
obrigado a corrigir o desequilíbrio, criando impostos sobre a mercadoria na
chegada ao Brasil.
EQUILÍBRIO DAS CONTAS PÚBLICAS – Quem conhece o Brasil sabe
como as políticas econômicas (a fiscal e a monetária) adotadas aqui por décadas
e décadas têm sido usadas: completa irresponsabilidade com o futuro do Brasil. Um
exemplo bem prosaico é o número de órgãos da administração federal direta: trinta
e sete ministérios, com os respectivos cargos. Há ministros que sequer
despacharam uma única vez com o atual presidente da República. As diversas
administrações federais nunca deixaram passar oportunidade de aumentar despesas,
atitude fundamentada em nova teoria econômica desenvolvida por Lula da Silva e
Gleisi Hoffmann, ex-professores de economia de Harvard. Recentemente eles
decretaram a obsolescência de todos os manuais de economia atualmente usados no
ensino universitário ao redor do mundo. A teoria diz (pelo menos Lula afirma
isso) que, quanto mais despesas públicas sejam feitas, mais riqueza será criada,
levando-me a concluir pela chegada, ainda no nosso tempo de vida, do Paraíso na
Terra. Elevados os gastos, todos nós ficaríamos ricos, no Brasil, no resto do
mundo e por toda a vastidão do Universo, sem perigo do aumento descontrolado da
inflação aqui na Terra. Lula é a favor do imposto sobre comprinhas com base
nessas ideias. Quer mais dinheiro para gastar sem freios. Deveria se aconselhar
com Dilma Roussef, a fim de evitar tombo semelhante ao dela, quando ela virou
ex-presidente antes do tempo.
IMPOSTO DAS COMPRINHAS – Um leitor de meia idade poderá
não se lembrar da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira. Como o
nome indicava, era para ser provisória e foi criada ainda no governo Fernando
Henrique Cardoso, em 1996. Lula, em 2007, queria prorrogá-la até 2011. Se
deixassem, seria prorrogada indefinidamente, como habitualmente. No entanto, o
Congresso, alegando o gigantismo da carga tributária no Brasil, frustrou a tentativa.
Parece mentira, mas não é. O Legislativo afirmou na época que o governo deveria
reduzir despesas e não aumentar impostos. O mesmo deveria ser feito hoje.
Infelizmente, há cerca de dois dias o novo imposto foi
aprovado. Nos debates daí nascidos, falou-se muito sobre proteção à indústria
nacional contra a concorrência estrangeira bem como sobre a preservação dos
empregos locais. Pois bem, grupos de pressão empresarial, fizeram forte
trabalho a favor da criação de barreiras às blusinhas, a fim de defender seus
próprios interesses. Quem falou em defesa do consumidor, o prejudicado mais
evidente nessa história? Ninguém.
Todavia, se os produtos chineses chegam aqui com isenção de
imposto na origem, o racional seria diminuir ou eliminar os abusivos impostos
daqui, como forma de manter o preço de nossa produção competitivo e não impor
abusivamente novos tributos. O resto é manutenção do lixo protecionista de
sempre. O consumidor brasileiro de baixa renda ficou ao deus-dará. E os
empresários ao deus-já-me-deu.
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