Sofá Olímpico

Jornal O Estado do Maranhão.



          A abertura da Olimpíada do Rio foi muito bonita e criativa. Modernas tecnologias foram usadas sem exagero na apresentação e houve emoção na dose certa, apesar de alguns clichês e certa tendência a desnecessária folclorização cultural. Mas os equívocos não chegaram a prejudicar o todo. Nesse aspecto, o país está de parabéns; não, porém, nos exageros da imprensa acerca de falhas iniciais na organização. Elas ocorrem em todo lugar, em todos os eventos desse porte. O aspecto negativo que explica grande parte dos problemas da Olimpíada está no período de realização das obras.
          Algumas delas atrasaram e foram inauguradas quase no dia da abertura. Ora, atrasos não são obras do acaso. Resultam de bem urdidas manobras visando ao aumento de preços. É essa a maneira das peças dessa trama se encaixarem com naturalidades, se aceitas as premissas das alegadas necessidades de aumento, e todos os atores saírem satisfeitos e um pouquinho mais hígidos financeiramente.
          Mas, sendo entusiasta dos esportes, atividade entre as mais nobres dos humanos, dedico-me, no momento, a apreciar o belo espetáculo de autossuperação de parte dos atletas, em momentos extremos que alcançam os limites físicos e psicológicos dos membros de nossa espécie. Deixo o gerenciamento das consequências de eventuais golpes financeiros (nem todos os recursos destinados aos jogos vieram do setor privado) às autoridades.
          Para poder tudo apreciar com conforto e colocar a minha disposição as mais modernas tecnologias, comprei um sofá olímpico. Isso, mesmo, sofá olímpico. Não sei se o leitor viu os comerciais de TV com anúncios de tal produto, lançado há poucos dias.
          O sofá é motorizado e possui quatro pequenas rodas. Desse modo, sua movimentação silenciosa por meio de pequeno, mas potente motor é fácil e prática. Se você sentir vontade de ir ao banheiro, digamos para o número 1, basta apertar um botão. Automaticamente ele o levará até a porta do referido compartimento e, com uma varinha, nela dará três batidinhas. Se ele não ouvir a famosa frase “tem gente”, liberará seu cinto de segurança e abrirá gentilmente a porta do banheiro, retirando-se em seguida, para apanhá-lo de volta em tempo previamente programado.
          O sofá tem capacidade de, em resposta a assovio de quem o adquiriu, liberar quantas cervejas você desejar, recurso ocioso no meu caso, mas utilíssimo para a maioria dos usuários. Tal novidade evitará que você irrite sua mulher com pedidos deste tipo: “Amor, apanha uma cerveja aí na geladeira”. Tem mais. Ele irá ligar ou desligar seu aparelho de TV, de acordo com o teor alcoólico baixo ou alto de seu sangue, impedindo você de aumentar ao máximo seu aparelho de TV e incomodar os vizinhos.
          Quando o quadro de medalhas aparecer na TV, ele inflacionará os resultados do Brasil, fazendo crescer o patriotismo inquebrantável de seu proprietário e o de milhões de brasileiros, evitando decepções a curto prazo e estresse agudo, que fazem mal ao coração.



Aos que duvidarem da existência dessa maravilha tecnológica, informo apenas que o sofá é capaz de corrigir previsões otimistas demais, trazendo seu dono ao mundo real: ele foi o único a prever que Tiago Pereira, excelente nadador, mão poderia vencer Michael Phelps, como acabou acontecendo.

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