Yes, nós temos tomate
Jornal O Estado do Maranhão
A marchinha de Carnaval Yes, nós temos banana, composta em 1937 por Braguinha e Alberto Ribeiro, extraordinária dupla de compositores, fez um sucesso danado no Carnaval de 1938, em gravação de Almirante. Chegou, com o movimento Tropicalista na música, a ser gravada por Caetano Veloso em 1967: “Yes, nós temos banana / Banana pra dar e vender / Banana, menina, tem vitamina / Banana engorda e faz crescer. / Vai para a França o café, pois é / Para o Japão o algodão, pois não / Pro mundo inteiro, homem ou mulher / Bananas para quem quiser. / Mate para o Paraguai, não vai / Ouro do bolso da gente não sai / Somos da crise, se ela vier / Bananas para quem quiser”.
A letra tem duplo sentido de conteúdo erótico, mas também alude
às chamadas “repúblicas bananas”, termo cunhado por O. Henry, escritor
americano, com o fim de designar países da América Central, cujas economias se
especializaram, nos séculos XIX e XX, na monocultura de produtos agrícolas de
exportação, sendo a banana um dos mais importantes, em um sistema chamado plantation, de grandes latifúndios.
Depois, o termo passou a abranger qualquer país com uma economia com aquelas
características. Quando a marcha foi composta, as exportações brasileiras eram
quase todas de café e poucos outros produtos agrícolas.
Mas, o que eu queria dizer era o seguinte. A economia brasileira
cresceu bastante de lá para cá, diversificou, mas não tanto, sua pauta de
exportações, modernizou-se. No entanto, tantos anos passados, continuamos, tudo
me faz crer, na dependência do cultivo da terra, pois essa é a dedução lógica
dos estragos, segundo o governo, que o preço do tomate vem fazendo na inflação.
O leitor poderá não se lembrar, mas houve uma época em que o chuchu, isso
mesmo, essa coisa sem gosto, sem cor, sem odor, sem nada e, por isso mesmo, repugnante
serviu ao fim justificar o aumento da taxa de inflação. O vegetal teve seus quinze
minutos de fama. O tomate hoje é o chuchu ontem.
Eu imagino os tomates de minha horta, meio chateados e vermelhos
de frustração, com insônia, pensando nos pratos a que servem de enfeite, para
depois serem mastigados, ou fazendo reflexões filosóficas sobre o motivo de as
crianças os encararem com ares de poucos amigos ou, ainda, de serem colocados
em todas as comidas de restaurante de fast
food. Meio paranoicos, pensam que há um complô do mundo contra eles.
Mas a verdade é esta. Eles sempre tiveram inveja dos seres do
mundo animal, da galinha, do pato, do peru, que pelo menos podem tentar, antes
de serem capturados e enviados à panela, uma fuga com as própria pernas ou asas,
em vez de esperarem passivamente a chegada de seus perseguidores dispostos a levá-los
às cozinhas de residências e restaurantes. Onde estão suas pernas, onde estão suas
asas para lhes dar alguma chance de sobrevivência?
Foi tudo isso que os levou a imaginar um plano perverso. Decidiram
espalhar um vírus contagioso ao extremo, a fim de prejudicar, não os
bolivarianos, adeptos do vermelho, mas o povo brasileiro, tão ordeiro e
respeitador das leis: o arrepiante vírus da inflação.
Com origem em aparentemente nada, a inflação começou então a
subir semana após semana. Assustados e pensando nas eleições de 2014, o
Ministério da Fazenda e o Banco Central iniciaram a busca pelos culpados e logo
anunciaram a descoberta: quem causava o aumento eram os tomates. Desconfiavam
de um tomatus inflationes virus mas não tinham certeza de nada.
Certeza tinham de que o aumento não tinha relação alguma com o descontrole dos
gastos do governo. Houve quem sugerisse a “solução chuchu”, o expurgo, do
cálculo da inflação, do tomate, mas a ideia não andou.
Resumindo, os legumes, ou frutas, ninguém sabe ao certo, aliviados
de sua inveja pela visão dos transtornos que causavam, retiraram, não se sabe
como, o vírus implantado na inflação, que diminuiu, e tudo voltou ao normal. Os
homens do governo saíram então cantando e saltitando na ponta dos pés: “Yes,
nós temos tomates / Tomates pra dar e vender...”.
Já se
anuncia um aumento no preço do leite. Seriam as vacas as culpadas?
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