Justiça Federal concede liminar contra o bar Trapiche
Conforme a imprensa noticiou nos últimos dias, a Justiça
Federal concedeu liminar em Ação Civil Pública interposta pelo Ministério
Púiblico Federal contra o bar Trapiche. Tanscrevo aqui: 1) resumo da decisão e
2) sua íntegra.
1) Resumo da decisão
Com tais
considerações, DEFIRO o pedido de antecipação dos efeitos da tutela
jurisdicional para DETERMINAR aos requeridos, sob pena de multa diária de R$
2.000,00, em caso de descumprimento total ou parcial:
1) a
abstenção de realização de eventos, inclusive shows com som amplificado, que
possibilitem a aglomeração excessiva de pessoas no Bar Trapiche/Clube 01 de
Regatas;
2) a
remoção, no prazo de 7 dias, de palcos, tendas, coberturas, toldos,
tapumes ou quaisquer outros objetos ou construção utilizados para a realização
de eventos que interfiram negativamente no Forte de Santo Antônio, inclusive de
equipamentos instalados na areia da praia.
Quanto ao
item 2, deverá o IPHAN providenciar a visita de agentes de seu corpo técnico a
fim de identificar quais estruturas deverão ser removidas e notificar os réus
para tanto, o que deverá ser informado nos autos e servirá como marco inicial
para contagem do prazo acima fixado.
Ainda
quanto o item 2, considerando não ter havido antecipação de tutela no processo
n.0 92.833-0, sendo recebida apelação com efeito suspensivo, fica assegurado
aos réus a manutenção das construções existentes à época da perícia realizada
naqueles autos.
A multa
não impede a adoção das medidas indispensáveis a garantir o cumprimento desta
decisão (busca e apreensão, prisão em flagrante por crime de desobediência,
remoção de pessoas e coisas, impedimento de atividades nocivas,
indisponibilidade de bens e valores), se necessário, com requisição de força
policial.DEIXO para apreciar o pedido de inversão do ônus da prova na fase de
saneamento, na qual examinarei a necessidade de inversão ou mesmo distribuição
do ônus da prova (princípio da cooperação).
FACULTO à
UNIÃO e ao IPHAN manifestarem-se sobre eventual interesse em integrar a relação
processual (Lei 7.347/85, art.5°,§ 2°). INTIMEM-SE.
Citem-se
e intimem-se.
São Luís,
04 de fevereiro de 2013;
Ivo
Anselmo Höhn Junior
Juiz Federal
Juiz Federal
2)
Íntegra da decisão
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE 1" INSTÂNCIA
SEÇÂO JUDICIÂRIA DO MARANHÃO
SEÇÂO JUDICIÂRIA DO MARANHÃO
8ª VARA
PROCESSO N. 1885-75.2013.4.01.3700
CLASSE:
7100- AÇÃO CIVIL PÚBLICA
AUTOR:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉUS: CLUBE 01 DE REGATAS
ALEXANDRE HENRIQUES
MARTINS JORGE
MARTINS JORGE
RICARDO FERNANDES DE
SOUSA
SOUSA
DECISÃO
I –
RELATÓRIO
Trata-se
de Ação Civil Pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra o CLUBE
01 DE REGATAS, ALEXANDRE HENRIQUE MARTINS JORGE e RICARDO FERNANDES DE SOUZA,
cujo objetivo é "promover a proteção da Fortaleza de Santo
Antônio, bem tombado pela União, que se localiza no bairro da Ponta D’Areia,
nesta capital ".
Em
síntese, sustenta o MPF que o imóvel estaria exposto à situação de risco à sua
integridade, provocada por ações decorrentes da exploração de atividade e de
construções ilegais em estabelecimento localizado em seu entorno, denominado Bar
Trapiche ou Clube 01 de Regatas.
Alega que
o Forte sofre com o impacto sonoro e a grande movimentação de pessoas e de
veículos pesados, fatos provocados pela realização de eventos de grande porte,
e tem sua visibilidade prejudicada por construções indevidas que transgridem o
art. 18 do Decreto-lei 25/3 7.
Pede o
deferimento de antecipação dos efeitos da tutela para que sejam determinados: 1)
a imediata
abstenção de realização de eventos (especialmente shows com som amplificado) que impliquem em aglomeração excessiva de pessoas no Bar Trapiche/Ciube 01 de Regatas, e 2) a remoção, no prazo de 72 horas, de palcos, tendas, coberturas, toldos, tapumes ou quaisquer estruturas, conforme identificado na Informação Técnica n. 373/2012-IPHAN, ou qualquer outra que possa interferir na visibilidade de ou na ambiência do Forte de Santo Antônio, inclusive de equipamentos instalados na areia da praia.
abstenção de realização de eventos (especialmente shows com som amplificado) que impliquem em aglomeração excessiva de pessoas no Bar Trapiche/Ciube 01 de Regatas, e 2) a remoção, no prazo de 72 horas, de palcos, tendas, coberturas, toldos, tapumes ou quaisquer estruturas, conforme identificado na Informação Técnica n. 373/2012-IPHAN, ou qualquer outra que possa interferir na visibilidade de ou na ambiência do Forte de Santo Antônio, inclusive de equipamentos instalados na areia da praia.
Inicial
instruída com documentos (fls. 16/83).
II –
PRELIMINAR
Destaco,
preliminarmente, que esta ação civil pública tem por objeto a discussão acerca
de alegados impactos negativos ao Forte de Santo Antônio em decorrência da
realização de eventos no Bar Trapiche/Clube 01 de Regatas, provocados pela
movimentação desordenada de veículos pesados e de pessoas, utilização de
equipamentos de sonorização de grande porte e existência de estruturas que
impediriam a visualização do bem tombado.
Não se
confunde, portanto, com a Ação Ordinária n.0 92.00.00833-0, ajuizada pelo
Município de São Luís contra o Clube 01 de Regatas e Alexandre Henriques
Martins Jorge.
Naquele
processo, discute-se a utilização irregular da propriedade, haja vista as construções
pretéritas no Clube 01 de Regatas que reduziram a visibilidade do imóvel
tombado, sem a autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional - IPHAN.[1]
O objeto
da presente ACP também é distinto da ACP n. 40685-22.2012.4.01.3700, proposta
pelo IPHAN contra o Estado do Maranhão, visando reformar de restauração no
Forte de Santo Antônio.
III- FORTE DE SANTO ANTÔNIO
III- FORTE DE SANTO ANTÔNIO
O Forte
de Santo Antônio[2] relaciona-se de modo
importante com a história de São Luís, desde os anos seguintes à fundação da
cidade.
Sua
primeira construção, ainda em faxina e terra, é atribuída aos franceses,
durante os combates de 1614, dos quais resultaram a expulsão dos fundadores e o
seguinte domínio português.[3]
A esse
respeito, já registrava em 1833, o historiador Cerqueira e Silva:
"Na
manhã seguinte [1 de Novembro de 1615] desembarcou Alexandre de Moura na ilha
de S. Francisco, pouco mais d'um tiro de canhão distante da fortaleza de S.
Luiz, levantando ali uma fortificação de pau-a-pique, a que se deu o nome do
forte da [sic] Sardinha, guarnecendo-o Bento Maciel Parente com a equipagem do
seu navio, e passou a sitiar por mar os Franceses, que desanimando contra a
expectativa de Ravardiere, fizeram com que este se rendesse, passando à ilha
assinou logo um termo da entrega da colônia e evacuação da fortaleza, passando
à Europa em três navios, que aprontou Alexandre de Moura, mais de quatrocentos
franceses, ficando porém outros, que por estarem casados com Índias não
quiseram acompanhá-los, e seguindo Ravardiere para Pernambuco com Alexandre de
Moura, a 9 de Janeiro de 1616."[4]
No final
do século XVII, a edificação rudimentar do Forte de Santo Antônio foi substituída
por uma construção de pedra. CÉSAR AUGUSTO MARQUES, um dos mais importantes
historiadores do Maranhão, aponta em seu "Dicionário"[5] referências documentais sobre essa
época:
"A
Câmara de São Luís em carta de 18 de fevereiro de 1689 escrevia ao governador
dizendo: 'As obras da fortaleza da Ponta de João Dias, com as novas ordens de
V. Sa., as largou por mão o Sargento-Mar Antônio de Barros Pereira, não sabemos
se foi ordem de V. Sa. ou moto próprio, contudo ficamos de acôrdo em ir
mandando carregar para ela pedra para que esteja ao pé da obra, e seguiremos no
mais o que V. Sa.. ordenar. Por Carta Régia de 8 de outubro de 1691 consta que
o governador do Maranhão dava princípio a esta fortaleza, com grandes
dificuldades por falta de engenheiro, pedreiros, índios de serviço, materiais e
cal do reino."[6]
O Forte
de Santo Antônio passou por reformas, ruínas e reconstruções. Cerca de um
século depois, ainda era estrategicamente importante para a defesa da cidade,
conforme consta em relatório de 1797, encaminhado ao Governador da Capitania:
"O Ajudante-de-Ordens Luís Antônio Sarmento da Maia em 14 de março de 179 7 disse o seguinte a O. Fernando Antônio de Noronha: 'O reduto de Santo Antônio, fortificação passageira, mandada fazer por V.Exa., é o mais vantajoso pôsto por tôdas as razões, porque além de estar tão próximo à barra para a poder defender com muita vantagem, tem também a de não poderem os inimigos ataca-lo com grande frente por terra, e seria sem dúvida a máxima defesa desta cidade, se o dito reduto, em lugar de fortificação de campanha ou passageiro, passasse a ser construído de pedra e cal, com o mesmo risco, que já teve, o qual era um paralelogramo romboidal, oferecendo um dos seus maiores lados para a entrada da barra e um ângulo obtuso para dentro do canal."[7]
"O Ajudante-de-Ordens Luís Antônio Sarmento da Maia em 14 de março de 179 7 disse o seguinte a O. Fernando Antônio de Noronha: 'O reduto de Santo Antônio, fortificação passageira, mandada fazer por V.Exa., é o mais vantajoso pôsto por tôdas as razões, porque além de estar tão próximo à barra para a poder defender com muita vantagem, tem também a de não poderem os inimigos ataca-lo com grande frente por terra, e seria sem dúvida a máxima defesa desta cidade, se o dito reduto, em lugar de fortificação de campanha ou passageiro, passasse a ser construído de pedra e cal, com o mesmo risco, que já teve, o qual era um paralelogramo romboidal, oferecendo um dos seus maiores lados para a entrada da barra e um ângulo obtuso para dentro do canal."[7]
O Forte
chegou a abrigar, por breves dias, um governo provisório formado pelos
revoltosos de 1824, conforme registro de CÉSAR MARQUES:
"Em
14 de julho de 1824 o destacamento, aí estacionado sob o comando do 2° Tenente
de Artilharia Manuel Joaquim Gomes, sublevou-se contra o Presidente Bruce, e
constituiu um governicho com a denominação pomposa de Junta Temporária, sujeita
à Junta Expedicionária da Freguesia do Rosário.
No dia 17 por ordem da presidência os fortes de S. Luís e de São Marcos cruzaram fogo contra esta fortaleza, incendiaram-lhe a casa da pólvora, e obrigaram os revoltosos a abandoná-la."[8]
No dia 17 por ordem da presidência os fortes de S. Luís e de São Marcos cruzaram fogo contra esta fortaleza, incendiaram-lhe a casa da pólvora, e obrigaram os revoltosos a abandoná-la."[8]
Esse
breve relato demonstra o valor histórico do Forte de Santo Antônio. Sob
diversas formas, construído e reconstruído com os materiais disponíveis em cada
época, foi testemunha de eventos históricos importantes ao longo dos 400 anos
da cidade de São Luís.[9]
IV-
ANÁLISE DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
A
concessão de tutela jurisdicional antecipada exige, nos termos do art. 273 do
CPC, fundamento relevante e risco de ineficácia da medida caso seja deferida
somente ao final do processo. Em resumo, a presença do que se convencionou
chamar de fumus boni iuris e periculum in mora.
Nesse
sentido, é procedente o pedido de antecipação da tutela jurisdicional,
referente à abstenção de realização de eventos (especialmente shows com som
amplificado) que impliquem em aglomeração excessiva de pessoas no Bar
Trapiche/Clube 01 de Regatas e a remoção de palcos, tendas, coberturas,
toldos, tapumes ou qualquer outra estrutura que possa interferir na
visibilidade ou na ambiência do Forte de Santo Antônio, inclusive de
equipamentos instalados na areia da praia.
O
primeiro dos pressupostos – prova inequívoca conducente à verossimilhança das
alegações, consistente, em linhas gerais, na aproximação entre os juízos de
probabilidade (cognição sumária) e de certeza (cognição exauriente) - está
presente na medida em que a prova documental produzida demonstra que o
imóvel em questão é bem tombado pelo Governo Federal (Processo n.
0930-T-75, do Livro Histórico - inscrição n. 455, de 03.08.1975).
A prova
documental produzida pelo IPHAN e pela Defesa Civil demonstra que a
estrutura do Forte encontra-se em estado de risco em razão da utilizacão
inadequada pelos réus de propriedade localizada em seu entorno.
O
relatório técnico elaborado por agentes de fiscalização do I PHAN noticia a
realização de eventos de grande porte no entorno do Forte de Santo Antônio. O
documento informa que a trepidação decorrente da sonorização nas proximidades
do Forte e a movimentação excessiva e desordenada de veículos geram impactos
negativos à sua estrutura.[10]
No mesmo
sentido, o Relatório Técnico de Engenharia n. 039/2012 [11] , elaborado pela Defesa Civil/Corpo de
Bombeiros, indica que, dada a proximidade ao imóvel tombado, "a região
não é propícia para a realização de eventos externos rotineiros ou
repetitivos, de grande demanda de público e carregamento concentrado".
O IPHAN
afirma que, embora desejável a manutenção de eventos no local – pois a
utilização e movimentação nos bens favorecem sua proteção e conservação - a
destinacão dos imóveis próximos ao bem tombado não pode resultar em
situacões prejudiciais à sua preservacão.
Nesse
contexto, o procedimento administrativo que instrui a petição inicial indica
que no Bar Trapiche/Ciube 01 de Regatas foram construídas estrutura de palco de
grande porte e outras edificações como tapumes, coberturas, tendas, toldos,
banheiros etc. (fotografias às fls. 57/61).
Naquele
local realizam-se eventos que geram trânsito de veículos pesados e aglomeração
excessiva de pessoas, circunstância não condizente com a preservação e proteção
do imóvel tombado (Ofício 329/2012GAB/IPHAN/MA, fls. 1 7/18 e fotografias às
fls. 19/21).
Tem se
agravado ao longo do tempo a situação de degradação no entorno do Forte de
Santo Antônio, ai incluindo construções indevidas no Bar Trapiche/Ciube 01 de
Regatas e prejuízo à visibilidade e à ambiência do bem tombado.
IV.1 Ação
Ordinária n. 92.833-0
Tramita
nesta vara ação proposta pelo Município de São Luís contra o Clube 01 de
Regatas e Alexandre Henriques Martins Jorge, tendo a União como assistente
litisconsorcial do autor.
Naqueles
autos, foi realizada perícia, cujo laudo foi apresentado em setembro/2006. O
perito concluiu na ocasião, a respeito da área onde está instalado o Bar do
Trapiche/Clube 01:
"1.2)
Da Área
...
segundo a Secretaria de Patrimônio da União-SPU, (...) tal área tem sua
formação como terrenos de marinha e acrescido de marinha. Possui topografia em
declive suave orientado no sentido da maré, solo arenoso com características de
areia de praia (...)
Outrossim,
(...) é parcialmente cercada e provida, em menos de sua metade, de vegetação
nativa (típica de praia) de porte rasteiro e em fase de reconstituição, a qual
se evidencia principalmente no lado esquerdo da área.
Verificou-se
também que o referido parcelamento está localizado no entorno de outro, o qual
abriga elemento construído de valor histórico/cultural, e tombado pela União
Federal, tratando-se de obra de Arquitetura Militar Colonial denominada
Fortaleza de Santo Antônio. (grifei)
“IV –
(...)
De acordo
com a localização presumida da Linha de Preamar Média (LPM) no trecho de praia
da Ponta D 'Areia, entre as cotas 11 e 7, 5 do Levantamento Aerofotogramétrico,
bem como o fato de a área em que se assenta o imóvel em questão se encontrar
abaixo da COTA 5 desse mesmo levantamento, depreende-se que se trata de
terrenos acrescidos de marinha, por sua vez incluídos entre os bens imóveis
da União Federal. (grifei).
Disse o
perito judicial, acerca da ambiência entre o Clube 01 e o Forte de Santo
Antônio:
"2.
6) Distância entre as construções de que trata o litígio
Com
relação à distância entre as duas construções envolvidas na questão, isto é, a
Fortaleza de Santo Antônio e o imóvel predial do empreendimento do réu,
anota-se que é de cerca de 25,00 m, entre os pontos mais próximos, e da ordem
de 54,50 m entre os seus pontos mais distantes (. .. )
Finalmente,
a respeito dos danos causados ao Forte de Santo Antônio:
"2) Tendo em vista, no presente caso
da fortificação relacionada ao imóvel do objeto da lide, que existe uma íntima
relação entre esta construção (o Forte) e o mar, portanto, não se podendo
excluir este elemento da ambiência, outrossim, que uma edificação que está por
ser erguida só deverá sê-lo na medida em que não interfira significativamente
no espaço envolvente de outra(s) ali existente(s), observando-se ainda que tal
entendimento extrapola o aspecto pura e simplesmente visual, depreende-se que a
edificação do Clube 1 de Regatas, em virtude da proximidade e por ter massa
construtiva, relativamente àquela da Fortaleza de Santo Antônio, bastante
representativa, de fato promove uma alteração do meio onde esta última está
inserida.”
Já em 2006, portanto, perícia indicava que as construções na área do Clube 01 de Regatas interferiam negativamente no ambiente do Forte de Santo Antônio, tanto em razão de afetar a visibilidade, quanto pela volumetria das estruturas.
Já em 2006, portanto, perícia indicava que as construções na área do Clube 01 de Regatas interferiam negativamente no ambiente do Forte de Santo Antônio, tanto em razão de afetar a visibilidade, quanto pela volumetria das estruturas.
Deve-se
ressaltar que as construções atuais são muito maiores do que aquelas
encontradas pelo perito, em 2006.
O laudo
pericial então produzido registra que a altura máxima da construção em relação
do nível do terreno era de 4,10 m.[12].
Hoje, apenas o palco (tenda de estrutura metálica em forma de concha) possui
cerca de 9m de altura.[13]
Os
pedidos formulados na Ação Ordinária n.0 92.833-0 foram julgados procedentes,
ou seja, os réus foram condenados a demolir as construções descritas naquele
processo.[14]
Considero
relevante transcrever parte da sentença proferida naqueles autos pelo Juiz
Federal José Carlos do Vale Madeira:
"(
...) o tombamento encontra-se disciplinado infraconstitucionalmente pelo DL 25,
de 30 de novembro
de 1937, sendo essa norma precursora no trato da proteção do
patrimônio cultural brasileiro e detentora, a despeito de seu longo
tempo de existência, das regras básicas deste instituto, que foram
recepcionadas e revigoradas pela vigente Constituição Federal.
(...)
Levando
em consideração o precioso acervo arquitetônico da cidade de São Luís, e tendo
por suporte legal o aludido DL 25137, o Poder Público houve bem efetuar, ainda
na década de setenta, o tombamento de um número considerável de prédios,
públicos e particulares, intervindo, assim, no direito de propriedade.
No caso
vertente, o dano causado pelos Réus ao patrimônio histórico da cidade de São
Luís decorre da construção da sede de um clube na vizinhança de imóvel tombado
pela União, reduzindo sua visibilidade e sem que tenha havido autorização do
Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Ante
essas conclusões, afigura-se relevante enfatizar que, entre os efeitos do
tombamento, inclui-se a proibição dos proprietários de imóveis vizinhos,
construírem prédios que impeçam, reduzam ou alterem a visibilidade da coisa tombada.
Cuida-se
de instrumento que visa conferir eficácia à preservação do bem cultural,
porque, e parece óbvio, o tombamento, sem outros recursos que assegurem a
visibilidade ou a integração do bem tombado à paisagem, não teria razão de ser.
Nessa
perspectiva, constitui-se a 'área de entorno' ou 'área envoltória', na qual o
modo de urbanização e a escala das construções erguidas podem interferir na
visibilidade do imóvel ou conjunto arquitetônico tombados.”
O art. 18
do Decreto-lei 25/37 impõe limitações aos imóveis vizinhos e exige prévia
autorização do IPHAN para construções no entorno:
Art. 18. Sem
prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, não
se poderá, na vizinhança da coisa tombada, fazer construção que lhe impeça ou
reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de
ser mandada destruir a obra ou retirar o objeto, impondo-se neste caso a multa
de cinquenta por cento do valor do mesmo objeto.
Como bem
ressaltou o Ministro VICTOR NUNES LEAL, no julgamento do RE 41.279/DF, "não
se trata de simples visibilidade física, mas da visibilidade de um ponto de
vista estético ou artístico, porque está em causa a proteção de um monumento de
arte...".[15]
No caso
analisado nestes autos, foram acrescidas construções àquelas já encontradas no
momento da sentença do processo 92.833-0. E não houve autorização prévia do
IPHAN.
Observo
que a Defesa Civil do Corpo de Bombeiros informou que "a região não é
propícia para eventos externos rotineiros ou repetitivos de grande demanda de
público e carregamento concentrado". Ao mesmo tempo, disse ter restringido
a ocupação do Clube 01 para o máximo de 380 pessoas (fls. 69/70).
A foto de
fl. 21 demonstra que a realização de shows no Bar Trapiche/Clube 01 atrai
grande quantidade de pessoas.
A Defesa
Civil também relatou que "o fluxo intermitente [de carros de passeio é
pernicioso." E que "veículos de grande porte não devem ser
liberados, salvo situações extemporâneas" (fls. 69/71).
V -
CONCLUSÃO
Em exame
de cognição sumária, há elementos que indicam degradação da ambiência no
entorno do bem imóvel tombado, estando afetada a visibilidade do Forte de Santo
Antônio.
Da mesma
forma, é sugestivo o risco de dano à própria estrutura do Forte, causado tanto
pelo impacto de ondas sonoras geradas por potentes equipamentos, quanto em
razão do trânsito de veículos pesados.
De
inteira aplicabilidade o princípio da prevenção, por meio do qual se
busca a melhor (mais eficaz) forma de tutela do meio ambiente contra os danos
que se mostram manifestos à vista do grau de verossimilhança dos fatos, os
quais sugerem o elevado potencial lesivo do empreendimento.
Cabe
ressaltar que na ideia de prevenção considera-se a cessação de atividade real
ou potencialmente danosa, ou seja, aquilo que se conhece no âmbito doutrinário
como prevenção pela correcão na fonte, com a supressão ou
impedimento de atividade ou comportamento que esteja na origem da situação
ilícita, evitando-se a criação e/ou agravamento do dano ao meio ambiente.
Nesse
contexto, a continuidade da realização de eventos pode servir à consolidação da
situação de grave degradação do monumento.
Com
tais considerações, DEFIRO o pedido de antecipação dos efeitos da tutela
jurisdicional para DETERMINAR aos requeridos, sob pena de multa diária de R$
2.000,00, em caso de descumprimento total ou parcial:
1) a
abstenção de realização de eventos, inclusive shows com som amplificado, que
possibilitem a aglomeração excessiva de pessoas no Bar Trapiche/Clube 01 de
Regatas;
2) a
remoção, no prazo de 7 dias, de palcos, tendas, coberturas, toldos,
tapumes ou quaisquer outros objetos ou construção utilizados para a realização
de eventos que interfiram negativamente no Forte de Santo Antônio, inclusive de
equipamentos instalados na areia da praia.
Quanto ao
item 2, deverá o IPHAN providenciar a visita de agentes de seu corpo técnico a
fim de identificar quais estruturas deverão ser removidas e notificar os réus
para tanto, o que deverá ser informado nos autos e servirá como marco inicial
para contagem do prazo acima fixado.
Ainda
quanto o item 2, considerando não ter havido antecipação de tutela no processo
n.0 92.833-0, sendo recebida apelação com efeito suspensivo, fica assegurado
aos réus a manutenção das construções existentes à época da perícia realizada naqueles
autos.
A multa
não impede a adoção das medidas indispensáveis a garantir o cumprimento desta
decisão (busca e apreensão, prisão em flagrante por crime de desobediência,
remoção de pessoas e coisas, impedimento de atividades nocivas, indisponibilidade
de bens e valores), se necessário, com requisição de força policial.DEIXO para
apreciar o pedido de inversão do ônus da prova na fase de saneamento, na qual
examinarei a necessidade de inversão ou mesmo distribuição do ônus da prova
(princípio da cooperação).
FACULTO à
UNIÃO e ao IPHAN manifestarem-se sobre eventual interesse em integrar a relação
processual (Lei 7.347/85, art.5°,§ 2°). INTIMEM-SE.
Citem-se
e intimem-se.
São Luís,
04 de fevereiro de 2013
Ivo
Anselmo Höhn Junior
Juiz Federal
Juiz Federal
NOTAS
[1] Poder-se-ia cogitar de conexão (art. 103 do CPC), todavia já foi prolatada sentença na Ação Ordinária n.0 92.833-0, afastando-se a reunião dos processos (Súmula
235/STJ).
[2] Outras denominações: Forte de Santo Antônio da Barra de São Luís, Forte
da Ponta D 'Areia,
Forte de Santo Antônio da Barra de João Dias.
[3] SOUSA, Augusto Fausto de. Fortificações
no Brazil. RIHGB. Rio de Janeiro:
Tomo XLVIII, Parte II, 1885. p.
5-140. Apud: <<http://fortalezas.org/index.php?ct=fortaleza&id_fortaleza=142>>
[4] CERQUEIRA E SILVA,
Ignácio Accioli de. Corografia Paraense ou Descripção Física, Histórica e Política
da Província do Gram-Pará. Bahia: Typografia do Diário,
1833. Apud:<<http://fortalezas.org/index.php?ct=fortaleza&id _fortaleza=142>>
[5] MARQUES, César Augusto.
Dicionário Histórico Geográfico da Província do Maranhão.
Rio de Janeiro:
Cia. Editora Fon-Fon e Seleta, 1970. 3a ed. 683 p. (1a edição: 1870).
[6] Op. Cit. p. 283.
[7] Op. Cit., p. 283.
[8] Op. Cit., pp. 283/284.
[9] Informações acerca do Forte de
Santo Antônio, no site "Fortificações no Mundo", do Projeto
Fortalezas Multimídia, da Universidade Federal de Santa Catarina UFSC: < <http://fortalezas.org/index.php?ct=fortaleza&id_fortaleza=142>
>
[10] fls. 54/61.
[11]
fls.
68/71
[12] fls. 233 do processo n.
92.833-0.
[13] fls. 54 destes autos.
[14]
O
processo n. 92.833-0 encontra-se em processamento da apelação interposta pelos
réus Clube 01 de Regatas e Alexandre Henriques Martins Jorge.
[15] O STF, então, deu provimento ao
Recurso Extraordinário e determinou a demolição, com fundamento no art.18 do DL
25/37, de um edifício construído à distância de 63 metros da Igreja da Glória,
no Rio de Janeiro.
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