Relatos do absurdo

                                                                       Jornal O Estado do Maranhão
         
           Se prestarmos atenção cuidadosa aos fatos, veremos como vivemos num mundo de acontecimentos absurdos e inusitados.
          Os casais chineses têm permissão do governo de ter apenas um filho. Se não bastasse o absurdo da medida, pois as pessoas deveriam filhos de acordo com a própria decisão, há mais um controle, o da população de cachorros. Em cada residência pode haver no máximo um e os de raças de grande porte são eliminados. Os apreciadores da degustação de carne desses animais, hábito muito difundido naquele país, aprovaram a medida.
          Um livro do século XVII foi a leilão na Inglaterra. E daí, perguntarão os curiosos. E eu respondo: a capa dele é feita com a pele de um padre jesuíta condenado por conspirar para assassinar Jaime I, em 1605. Para completar a história macabra, a obra trata exatamente da execução do padre que, mais tarde se soube, não participou do plano católico de matar o rei.
          Esta outra foi na África do Sul e é semelhante à que ocorreu no Big Brother Brasil. Um dos participantes do BB sul-africano, estudante de cinema, quem sabe do tipo ultrarrealista, estuprou uma auxiliar de enfermagem também participante do reality show, bêbada no momento da agressão. Ele se justificou assim mais tarde: Bem, isto é a África. Aqui a mesma frase poderia ser dita pelo estuprador brasileiro, apenas substituindo o nome do país.
          Agora esta que se imaginava não acontecer nos Estados Unidos, paraíso da medicina, do progresso tecnológico e da competência técnica. Um homem foi internado num hospital de Louisville, no Kentucky, para uma circuncisão. Amputaram-lhe o pênis. Depois da cirurgia, dele não se poderá dizer nem “coitado”, pois ele nunca mais praticará o coito. No máximo será um cortado. Se você, macho brasileiro, for àquelas terras, tome bastante cuidado, se lá lhe sugerirem uma cirurgia desse tipo, com louvações às virtudes da medicina americana. Não acredite. Em qualquer país você pode ser alvo de um ataque médico como esse. 
          Um homem de 99 anos foi espancado em Nova York. Isso acontece com certa frequência, dirá o leitor. Qual a novidade? A novidade é esta: o agressor era um jovem de 83 anos. Ele estacionou seu automóvel na porta da garagem da vítima, que, desejando desobstruir a passagem, pediu a ele a retirada do veículo de lá. Irritado, o infrator deu várias pancadas com uma barra de ferro na cabeça do quase centenário. Lamento do agredido: “Ele é muito mais jovem do que eu, muito mais forte. Ele poderia ser o meu filho.” O jovem foi convidado a lutar no UFC.
          Na França, um presidiário, bem ao estilo Roberto Jefferson, aquele deputado que denunciou o mensalão e tem seus piores instintos despertados pelo ex-ministro José Dirceu, do PT, matou um companheiro de crime na cadeia porque não ia com sua cara, que lhe despertava também instintos assassinos. Depois, abriu-lhe o peito para comer o coração. Em vez disso, anatomista incompetente, acabou devorando, cru, um dos pulmões. Ele então fritou o outro e comeu o petisco com cebolas. “Eu queria a alma dele”, disse, pensando ter degustado o coração bondoso do morto.
          Essas histórias estão no sítio Page Not Found, do jornalista Fernando Moreira, em http://oglobo.globo.com/blogs/pagenotfound/. Eu acrescentei a elas um pouco de ficção e algumas observações. Inusitadas e, sobretudo, absurdas, não estão, porém, muito distantes das vistas com frequência em todo lugar no Brasil.
          Como a do cidadão que no SUS tenta marcar uma cirurgia de urgência e consegue agendá-la para 6 meses depois, quando já estará morto; não obtém para o filho uma vaga perto de sua residência, na escola pública; é enganado pelos prestadores de serviços de telefonia, televisão a cabo e tudo fica por isso mesmo. Qual a diferença entre os dois grupos de histórias? Nenhuma. Ou melhor, existe uma: os relatos do primeiro são absurdos e inusitados, os do segundo, absurdos e corriqueiros, tão corriqueiros que às vezes não parecem absurdos. Parecem normais, como se encher de cerveja e sair dirigindo por aí. Espera aí, alguém aqui do meu lado diz que dirigir bêbado não é normal!

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