Banda Peninsular
Jornal O Estado do Maranhão
Li neste jornal, edição do dia 15 deste mês de janeiro, notícia de reunião entre o Ministério Público do Maranhão e a Secretaria de Trânsito e Transporte de São Luís, em que o órgão municipal se comprometeu a acatar recomendação dos promotores, de disciplinar o trânsito na chamada Península da Ponta da Areia, por ocasião do cortejo da Banda Bandida, durante todos os domingos até o fim do período de Carnaval. O acesso à área seria controlado: omente aos moradores, de posse de comprovante de residência, e hóspedes de hotéis dali, se permitiria a circulação em veículos automotores, com a finalidade, evidente, de chegarem a suas residências. As pessoas poderiam se deslocar a pé sem sofrer tal restrição, a ser iniciada às 15 horas e finalizada às 21 horas. Não sei o motivo de o acordo não ter sido honrado. Houve recuo do Ministério Público? Ou a Secretaria deu para trás? O certo é que ficou o dito pelo não dito.
Trago o assunto à discussão por dois motivos. Primeiro,
porque, como moradores do local, sofremos, eu e meus familiares bem como outras
vítimas do prédio e de prédios vizinhos, as consequências da confusão criada
nos últimos domingos naquele local desprovido de infraestrutura capaz de
receber multidões de eventos públicos. Realizá-lo ali é como realizá-lo no
Calhau, por exemplo, ou no Cohafuma, ou em quaisquer outros conjunto e área
residenciais de São Luís. Qual a motivação de fazê-lo justamente lá?
O segundo motivo é mais importante porquetem relação direta
com algo de grande importância na vida civilizada, mas na nossa sociedade não é
levado a sério, sendo tratado, até, como atitude exótica: o cumprimento da lei.
No tempo das cavernas, elas não existiam. Mandava o mais forte. Civilizarse é estabelecer
essas regras de convivência e obedecê-las. Confirma-se, pelo seu
descumprimento, a correta avaliação do cronista deste jornal, Joaquim Itapary,
de nesta cidade nada funcionar. Nisto está a raiz da existência de leis que
pegam ou não, traço de nossa cultura tão criticado exatamente pelos que contribuem
para torná-las inócuas.
Explico. Existe uma Lei do Silêncio, estadual. Ela não é
cumprida, ou só o é em pouquíssimos momentos, entre o primeiro e o último
minuto do evento. Na península, além do desfile de carros com potentes
equipamentos de som a todo volume, existe um bar chamado Novo Trapiche, useiro
e vezeiro em adicionar centenas de decibéis à balbúrdia sonora, nisso imitado
pela Associação de Fiscais da Prefeitura, localizada bem perto.
Independentemente, porém, do período carnavalesco, o Novo Trapiche perturba o
sossego público frequentemente.
Vamos pensar agora nisto: quem irá recuperar as calçadas dos
prédios e os canteiros centrais das vias públicas danificados pelo
estacionamento dos automóveis sobre eles? Nada tenho contra bandas ou contra a
Bandida. Aliás, tenho nela muitos amigos e até um irmão, João Carlos, um de
seus pioneiros.
Minha luta não é contra ninguém. É favor de princípios e da
lei. Tanto não tenho nada contra elas que estou organizando uma, a Banda
Peninsular. Ela será a melhor da cidade e percorrerá, sem pedido de licença a
ninguém, as ruas onde os líderes da Bandida residem, parando na porta de cada
um. E vou levar as torcidas do Flamengo e do Corinthians!
Passemos a questões referentes ao bom senso, tão em falta em
ocasiões como esta. A península não está preparada para receber multidões,
repito. Provam-no os milhares de homens e mulheres (acreditem) urinando em
qualquer lugar. Reflitamos, também, sobre situações de emergência. Por exemplo,
um morador idoso de um prédio necessita ser transportado a um hospital. Sitiado
como está, e havendo apenas duas vias de escoamento, o tempo desperdiçado no
rompimento da barreira formada pela multidão pode ser a diferença entre sua
vida e morte. No domingo passado, testemunhei a dificuldade de uma viatura
passar pela multidão e sair da península. O veículo era do quartel do
Grupamento Marítimo do Corpo de Bombeiros localizado a poucos metros do Novo
Trapiche, no Forte de São Antônio, edificação de valor histórico. Temos a
sensação de ser vítimas de sequestro e reféns em nossas próprias residências.
Por que não tomar como modelo o réveillon do Rio de Janeiro,
como o Ministério Público propôs inicialmente? Lá, as ruas de Copacabana são
interditadas sem se ouvirem reclamações.
Não faltarão tentativas de me classificar de adversário do
Carnaval, reacionário, direitista e bobagens assim. É reflexo condicionado
antigo que serve de biombo à indisposição ao debate e à disposição a fazer
descer pela goela alheia pontos de vista esdrúxulos. Se apegar-se aos fatos e
lutar pelo fiel cumprimento dos preceitos legais servir à tentativa de colar em
mim todos esses rótulos, assim seja.
Meu pedido às autoridades tem se resumido ao cumprimento da
lei, que, óbvio, deve ser obedecida por todos. É pedir demais? Se não for
possível cumpri-la, melhor revogá-la, por inútil. Não queremos, nem poderíamos
querer, o cerceamento do direito das pessoas de ir e vir. Contudo, não podemos
concordar com a lesão a nosso próprio direito. Apelamos ao bom senso dos
dirigentes da Bandida e pedimos que se imaginem em nosso lugar. Há dezenas de
locais na cidade adequados ao cortejo. Por que fazê-lo onde ele não cabe e
provoca tantos problemas?
Reconheço progressos no último domingo. As atividades
terminaram mais cedo e a poluição sonora foi menor, graças, em grande parte, à
pronta ação da delegada-geral de Polícia, dra. Cristina Meneses, com o suporte
da Superintendência de Polícia da Capital, Polícia Militar e Guarda Municipal. Mesmo
antes de receber qualquer apelo dos moradores, a delegada-geral já havia tomado
a iniciativa de combater com firmeza os excessos, em especial os devidos à
emissão de sons. Em outro trecho da Ponta Areia, o desrespeito à Lei do
Silêncio já havia sido objeto antes de ação semelhante por equipes dela com
pleno sucesso. Quando há determinação de fazer, há bons resultados. Temos
certeza de que as coisas estarão melhores ainda neste fim de semana e assim
permanecerão nos seguintes.
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