Shopping inundado

Jornal O Estado do Maranhão
Vejo na televisão pela enésima vez carros submersos no Shopping Monumental, no Renascença. Já aconteceu comigo também. Posso imaginar o que as pessoas sentiram ao ver seus automóveis destruídos pela inundação do estacionamento na segunda-feira passada. A situação repete-se regularmente nos períodos chuvosos.
Acompanhei grande parte da história que levou a essa situação kafkiana. Uso este termo porque as pessoas que vêm sendo prejudicadas ficam sem saber a quem responsabilizar pelos danos que sofrem. Penam de um lugar para outro, ouvem murmúrios de todos jogando a culpa em todos, seguem orientações erradas, ouvem que um alto burocrata em posição de decidir não decidiu porque não era conveniente e acabam percebendo que alguma força mais alta vai se alevantar para colocar a culpa nelas.
Vai ver, uma bela manhã de sol, sem essas chuvas inconvenientes que andam destruindo um bom pedaço desta cidade-patrimônio-da-humanidade, entram-lhe na sala de jantar oficiais de justiça para intimá-los não se saberá bem por quê e para quê. Aí as vítimas pensarão, da mesma forma que Joseph K., personagem de O Processo, de Kafka, que alguém certamente os haveria de ter caluniado pois estavam sendo acusados sem ter feito mal algum.
A confusão surgiu quando a firma Empresa Pacotilha Ltda., proprietária de O Imparcial, iniciou a construção da sede desse jornal em terreno atrás do shopping. As obras foram iniciadas irregularmente, com alvará de construção da Prefeitura de São Luís, é certo, mas sem a devida licença ambiental da Gerência Adjunta de Meio Ambiente ­– Gama, órgão do meio ambiente do Estado que eu dirigia naquele ano de 2000.
Questionada pela Promotoria de Meio Ambiente da Capital, dirigida pelo Dr. Fernando Barreto, a empresa, em reunião com ele, concordou em fazer a drenagem e solicitar a licença à Gama. Para formalizar o acordo, assinou um Compromisso de Ajustamento de Conduta, instrumento jurídico utilizado pelo Ministério Público nesses casos. O documento contou com a interveniência da Prefeitura de São Luís.
O receio da Promotoria e dos técnicos do meio ambiente, que resultou ser fundado, era de que houvesse inundações no período chuvoso, por causa da cota em que a construção estava sendo feita, muito elevada em relação ao restante da área. Temiam, também, a ocorrência de danos às áreas de mangue próximas.
No dia seguinte à reunião, o promotor recebeu um ofício da Prefeitura pelo qual esta assumia a responsabilidade pela execução da macrodrenagem da área. Se ela foi feita, deve haver algo errado, como se pode ver pelo que está ocorrendo. Se não foi, precisamos saber a razão. A dificuldade poderia vir de estar o estacionamento ao nível do mar. Tanto que as enchentes coincidem com as marés altas.
Simultaneamente, a direção do Monumental ajuizou uma ação contra a Empresa Pacotilha  Ltda., justamente por considerar que a construção iria causar, como de fato vem causando, graves inconvenientes aos usuários do estacionamento, às lojas e ao comércio do shopping. Essa ação ainda tramita na justiça estadual.
Informa-me o Dr. Barreto que, do ponto de vista legal, a responsabilidade pelos danos é da Prefeitura de São Luís que autorizou a construção. Mas acho que isso não diz tudo. A empresa, preocupada com o atraso nas obras e o risco de prejuízos, continuou a construção com base em alvará da prefeitura, mesmo sabendo que, se a drenagem não fosse realizada a contento e a tempo, os prejuízos seriam transferidos para terceiros quase imediatamente.
Quanto ao Shopping Monumental, o mínimo que se pode exigir dele é que alerte seus clientes sobre o perigo que correm naquele local inseguro.
Trago essas informações para que o leitor possa julgar por si mesmo. Assim, ele poderá fazer seu próprio juízo sobre a responsabilidade de cada um dos envolvidos. A esperança é de que não se vejam mais na televisão as cenas, que já se vão banalizando, de pessoas deseperadas a clamar em vão por seus direitos.

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