Retórica insustentável

Jornal O Estado do Maranhão
Em outubro de 2001, escrevi um artigo, aqui em O Estado do Maranhão, falando sobre o conceito de desenvolvimento sustentável e sua gradativa aceitação, por parte dos governos, no mundo todo. Eu terminei dizendo que haveria um encontro neste ano de 2002, em Johannesburg, África do Sul, a fim de avaliar o progresso alcançado na sua incorporação às políticas públicas, nos dez anos entre 1992 e 2002, e marcar a realização da Rio-92. “Será a hora de os países apresentarem os resultados de suas políticas para a implantação do desenvolvimento sustentável. Era para valer ou tratava-se de retórica, apenas?”. Agora, com o término do encontro, chamado Rio +10, realizado entre os dias 26 de agosto e 4 de setembro, julgamentos de seus resultados estão sendo feitos e continuarão a sê-lo durante algum tempo.
É preciso levar-se em conta, nas avaliações, que o conceito de desenvolvimento sustentável incluiu a idéia de diminuição da pobreza e das desigualdades econômica e social. Contém, também, a visão de preservação do ambiente e seus recursos naturais. As principais áreas em discussão no encontro, escolhidas com base na aceitação dessas noções, foram energia, agricultura, biodiversidade, água e ajuda ao desenvolvimento.
A maioria dos participantes considerou a Rio +10 decepcionante. Ela foi imaginada justamente como uma ocasião de implementação de planos de ação destinados a tornar efetivos os compromissos com a sustentabilidade assumidos na Rio-92. Resultou ser, lamentavelmente, um encontro em busca da salvação da reunião de 1992.
Os Estados Unidos adotaram a posição, bastante clara a todos, inclusive europeus, de andar em marcha a ré nos seus comprometimentos anteriores. Como é de amplo conhecimento, os americanos são os maiores consumidores mundiais de petróleo e seus derivados. Isso os torna os maiores emissores de gases, como o CO2, causadores da retenção de calor na atmosfera, resultando no efeito de estufa, que eleva a temperatura da Terra, com as conhecidas conseqüências negativas.
No entanto, em aliança com alguns países árabes, grandes produtores de petróleo, os americanos derrotaram o Brasil e a União Européia, que haviam feito uma proposta. Esta estabelecia que, da energia consumida no mundo, 10% fossem produzidos a partir de fontes renováveis. Concordou-se, somente, em, “com senso de urgência, aumentar substancialmente a fatia mundial de energias renováveis”, sem o estabelecimento, porém, de prazos e metas específicas, e em “instar os países que ainda não o fizeram a ratificar o Protocolo de Kyoto”, que trata da redução da emissão de gases-estufa.
O compromisso de destinação de 0,7% do Produto Interno Bruto – PIB dos países ricos, como ajuda ao desenvolvimento, acordado na Rio-92, foi ratificado, embora, na realidade, entre 1992 e 2002 a percentagem tenha caído até 0,22%. Mas, os Estados Unidos colocaram ressalvas, tornado-o, na prática, algo sem chance de ser cumprido.
Em apenas duas áreas, das cinco em discussão na Rio +10, foi possível estabelecer compromissos com metas e prazos. Uma área foi a de saneamento, com o objetivo de reduzir à metade, até 2015, o número de pessoas sem acesso a água potável e esgotos; a outra foi a de biodiversidade, de diminuir a perda de espécies até 2004, mas sem quantificação de metas, e, também, de restaurar os estoques de peixe a níveis sustentáveis até 2015, onde for possível.
De positivo, na Rio +10, houve o anúncio da decisão da Rússia, China e Canadá, de ratificarem o Protocolo de Kyoto, levando o governo americano a uma situação de isolamento internacional, pela recusa em seguir o exemplo dos outros.
Diante das difíceis circunstâncias, muitos comemoram. Apesar do boicote americano, dizem, pelo menos os princípios do desenvolvimento sustentável, aceitos na Rio-92, não foram rejeitados. Essa, a ironia dessa história. Quantos anos mais serão necessários para substituir-se a retórica vazia e insustentável da sustentabilidade por ações concretas?

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