O futuro do livro

Jornal O Estado do Maranhão
Na palestra do brasilianista francês Jean Soublin, na Academia Maranhense de Letras, sobre as imagens do Brasil na França ao longo dos séculos, encontro Sálvio Dino. Somos amigos desde o começo dos anos setenta, quando ele era um deputado estadual cassado “por atividades subversivas”, mas não ainda imortal, e eu um recém-formado economista. Naquela época éramos assessores de Jayme Santana, meu ex-colega de faculdade, então Secretário da Fazenda do Governo Pedro Neiva de Santana.
Sálvio pergunta à saída do auditório se conheço o famoso Jean Paul Jacob, que anda prevendo a morte do livro de papel, esse antigo e querido companheiro. Olho para os lados, certificando-me da ausência de testemunhas da minha ignorância e, meio envergonhado, confesso baixinho que não, mas que já tinha tido notícia dessa conversa em algum lugar. Talvez, em algum canto de um suplemento dominical de um jornal qualquer.
Ele, que prepara um livro sobre a dinâmica da ocupação do território maranhense, na suposição, naturalmente, de que livros continuarão a existir, fará uma palestra para estudantes do segundo grau, como representante da Academia, sobre a importância e valor do livro nos dias de hoje. Quer todas as informações que possa reunir sobre o assunto.
Corro para a internet. Confirmo a existência do tal Jacob. Ele é engenheiro da IBM e conferencista do Departamento de Engenharia Eletrônica e Ciência da Computação da Universidade da Califórnia. É brasileiro, formado pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica – ITA. Não lhe faltam credenciais.
Esse engenheiro se dedica ao estudo da tecnologia e seus desenvolvimentos futuros, incluindo engenharia de software, inteligência artificial e multimídia. Entre suas previsões está, por exemplo, a de que futuramente, ao fazer compras em supermercados, ninguém precisará preocupar-se em usar cartão de crédito e, muito menos, em pagar com cheque ou dinheiro em espécie. Ao sair da loja, os consumidores serão automaticamente identificados por sua “aura digital”. Com isso, um débito automático será feito em sua conta bancária.
Não duvido de previsões desse tipo. Afinal de contas, inovações tecnológicas inconcebíveis até há pouco tempo são, agora, parte de nosso cotidiano. Vejam a telefonia celular e a própria internet. Quem apostaria, alguns anos atrás, na viabilidade de podermos carregar telefones no bolso e de termos uma rede mundial de computadores que nos permitisse ver imagens e textos armazenados em computadores a milhares de quilômetros de distância? Ou de nos comunicarmos, rapidamente e a baixo custo, por meio do correio eletrônico?
Mas, com o livro a história é outra. O próprio Jacob admite a inviabilidade econômica de algumas tecnologias novas. Ou a rejeição delas pelos usuários, por não representarem vantagens reais para eles, em comodidade de uso ou longevidade dos produtos que as utilizam.
Até agora, pelo menos, não há nenhuma tecnologia de suporte para a escrita com a durabilidade do papel nem com sua comodidade ou praticidade. Nenhum meio de armazenamento eletrônico dura tanto quanto o papel. Ninguém consegue ler um livro numa tela de computador, com as tecnologias atualmente disponíveis. O livro eletrônico, hoje, é apenas uma idéia. Poderá ser um complemento, não um substituto do livro tradicional. Este é portátil, fácil de ser manuseado e não depende de eletricidade Por muito tempo será assim, acredito.
Mas o Dr. Jacob despreza outro fator, o mais importante em qualquer avaliação sobre o futuro do livro. É a relação emocional com esse objeto cultural. O leitor quer tocá-lo, alisar sua capa, sentir o cheiro do papel, a textura. Quer olhá-lo e saber que quando precisar dele, o terá ali, ao alcance da mão e da vista, para atendê-lo, informá-lo, iluminá-lo. Quer senti-lo como seu.
Mas, como tudo passa, o livro um dia passará. Como passará o nosso planeta, engolido pelo sol. Nesse dia, porém, tudo o mais também terá passado: a vida e a morte, os deuses e os homens.

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