Cadastramento de Novo
Jornal O Estado do Mararanhão
Em 2003, há quase oito anos, portanto, o ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, do PT, anunciou com indignação e como grande descoberta que espertalhões assaltavam o erário com muita eficiência (tirando proveito da ineficiência da burocracia estatal, claro). Velha tradição brasileira. Aproveitavam-se de falhas de várias naturezas nos sistemas informatizados do INSS (isso não foi dito pelo ministro). Mortos, alguns aposentados e pensionistas do Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS continuavam a ser pagos como se vivos fossem, mortos-vivos fazendo prosperar os muito vivos que se fingiam de bem mortos.
A saída, de acordo com Berzoini? Fazer o recadastramento dos beneficiários do INSS de 90 anos e mais, obrigando-os a comparecer a postos do Instituto onde passariam por interrogatórios e deveriam dar provas, não de vivacidade propriamente, mas de vida. Não adiantava levar carteira de identidade. Tinham de providenciar um atestado qualquer ou declaração de não sei quem. Exigência em tudo condizente com o Brasil, país do cadastramento, do recadastramento e do papel inútil. Mas, a bizarrice não parou aí. Eles teriam sua pensão bloqueada imediatamente. Era para esses teimosos, refratários a morrer, tomar consciência da brevidade da vida, não havendo razão de levá-la assim, até mais de noventa anos, e continuar arrastando suas velhices pela face da Terra, quando a geração deles já quase desaparecera.
A saída, de acordo com Berzoini? Fazer o recadastramento dos beneficiários do INSS de 90 anos e mais, obrigando-os a comparecer a postos do Instituto onde passariam por interrogatórios e deveriam dar provas, não de vivacidade propriamente, mas de vida. Não adiantava levar carteira de identidade. Tinham de providenciar um atestado qualquer ou declaração de não sei quem. Exigência em tudo condizente com o Brasil, país do cadastramento, do recadastramento e do papel inútil. Mas, a bizarrice não parou aí. Eles teriam sua pensão bloqueada imediatamente. Era para esses teimosos, refratários a morrer, tomar consciência da brevidade da vida, não havendo razão de levá-la assim, até mais de noventa anos, e continuar arrastando suas velhices pela face da Terra, quando a geração deles já quase desaparecera.
Houve tal gritaria e tantos protestos contra Berzoini que ele teve de abrir mão de suas más intenções. Antes de fazê-lo, porém, disse que não se desculpava de nada, mostrando, ainda, uma fé extraordinária em um computador moderníssimo, segundo ele capaz de resolver qualquer dificuldade administrativa. Depois, saiu-se com esta: “Estou convicto de que o combate à fraude vai exigir um grau de sacrifício de todos”. Fiquei imaginando qual sacrifício o ministro faria. A renúncia ao cargo já seria um bom começo.
Um subordinado dele foi mais realista do que o rei e se ofendeu mais do que o ministro ofendido pelas reclamações dos beneficiários e críticas da imprensa. Quando lhe pediram explicações sobre a intenção do Instituto, de atazanar a vida dos aposentados sem aviso prévio, franziu a testa, levantou o queixo, inflou o abdômen mal definido, respirou fundo com ar de enfado e anunciou: “A divulgação prévia acabaria levando às nossas agências muito mais do que os 105 mil beneficiários”. Logo, a solução seria fazer o tal recadastramento na surdina. Assim, a procura aos postos seria grande o suficiente para causar contratempos aos usuários, mas não aos funcionários do órgão.
Passaram esses anos todos e eis recente anúncio de ideia semelhante. O governo quer recadastrar, com um computador ultramoderno, aposto, todos os beneficiários, colocando sobre eles o ônus da prova de não serem fantasmas, mas ninguém, acredite se quiser, caro leitor, precisa se preocupar, porque daqui pra frente, tudo vai ser diferente, como na canção de Roberto Carlos. Pode ser, mas apenas na forma. A maneira de ver o problema continua a mesmíssima. O Ministério da Previdência tenta transferir ao aposentado a obrigação de cumprir lei que manda seja o falecimento de cidadãos brasileiros comunicado à previdência social pelos cartórios. Muitos destes, ocupados em fabricar dinheiro, não respeitam a exigência legal. As autoridades governamentais, não desejando incomodá-los, resolvem incomodar os idosos. É mais fácil.
Qual a dificuldade de exigir a comunicação das mortes? Por acaso elas não são mais registradas em cartório? A burocracia que as cerca foi eliminada sem mais nem menos? As pessoas agora morrem sem ninguém saber e são enterradas sem atestado de óbito? Confiar na honestidade dos parentes para a comunicação do falecimento é esperar demais dos instintos humanos, especialmente quando tudo que os “herdeiros” têm de fazer, de posse de uma procuração conveniente, há muito tempo em diversos casos, é ficarem quietos no seu canto e continuarem a receber a pensão como se vivos fossem os mortos.
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