A mensagem
Jornal O Estado do Maranhão
Os últimos quinze dias foram para mim de verdadeira provação bíblica e indescritível angústia existencial, pois me vi privado sem aviso prévio do meu computador. Tal tragédia criou mil problemas à realização das mais corriqueiras tarefas de meu dia-a-dia, como, por exemplo, esta de maltraçar algumas linhas destinadas à publicação neste jornal.
Para o ataque traiçoeiro à minha inseparável máquina, contribuíram em partes igualmente irritantes o ar salitroso do bairro do Olho D’água, que tudo corrói pacientemente, e a Companhia Energética do Maranhão - Cemar, que corrói nossa paciência toda e, não satisfeita, ainda faz oscilar a corrente elétrica, a fim evitar o perigo de os usuários esquecerem a qualidade desastrosa dos serviços da companhia.
Nunca poderei esquecer a situação em que me encontrava. Cabeça baixa, olhos pregados no chão, olhar perdido e passos vacilantes, vagava apático pela cidade pensando na minha situação de dependência em relação a essa máquina, vista ainda, algumas vezes, com desconfiança por tanta gente. Devo ter sofrido, com sua ausência, uma autêntica crise de abstinência, como aquelas originadas na retirada aos viciados do objeto do seu vício. Agora, superada a tensão desse momento ruim, passei a dar maior valor a ela. Prometi a mim mesmo jamais chamá-la novamente de lerda e de baixa potência, como fiz muitas vezes, ameaçando-a de entupi-la de viagra. Procurarei compreender melhor suas fraquezas e vacilações.
Pois bem. Eu, esse dependente da informática e da internet que assume um ar de superioridade quando vê alguém escrevendo a mão ou datilografando (nem sei se essa palavra é usada ainda) em uma velha Remington, fui “acusado”, faz poucas semanas, pelos colegas de trabalho, de não me utilizar de mensagens por correio eletrônico, ou seja de e-mails, e, portanto, do computador, para me comunicar no serviço. Fiquei surpreso.
Deixo logo claro isto, antes de fazerem deduções equivocadas. Existe um excelente ambiente de companheirismo e cooperação na Gerência de Indústria e Comércio. A “acusação” tinha, em primeiro lugar, a boa intenção de tornar mais rápida e eficiente o diálogo entre os diversos setores do órgão. Mas, não deixei de perceber uma certo espírito de gozação entre amigos na sugestão de eu usar o meio eletrônico com mais freqüência. Então o cara ligado na informática não utiliza o computador com o fim de difundir informações e dar orientações aos colegas?
Aleguei que a Gerência era pequena e nenhum funcionário estava a mais de 30 metros de seu mais distante colega. Seria mais fácil, eu dizia, ir às outras salas e discutir os assuntos importantes pessoalmente do que enviar frias mensagens pela internet. Mas, havia mais, embora eu não soubesse exatamente o quê até ter notícia de um estudo feito no Reino Unido em uma instituição de nome complicado, a Buckinghamshire Chilterns University College, de Londres. Além de confirmar meus argumentos, esse estudo apresenta outros em favor da moderação no uso de e-mails. Estes provocam a elevação da pressão arterial dos empregados de companhias privadas e públicas, especialmente se contêm críticas ou cobranças e são enviados pelos superiores hierárquicos.
A Câmara Municipal de Liverpool, mostrando estar consciente dos perigos do seu uso imoderado, eliminou a troca de mensagens entre seus funcionários às quartas-feiras. Eles são incentivados a resolver os problemas da instituição pessoalmente ou por telefone. Os dirigentes perceberam que o correio eletrônico pode ser usado como uma forma de evitar o enfrentamento de uma situação difícil. “Em alguns casos, o e-mail pode servir como uma camuflagem para a dificuldade de agir, de buscar uma solução”, disse Matthew Finnegan, diretor de midia da Câmara.
Tudo isso é prova dos cuidados que se deve ter na adoção de novas tecnologias. Em muitos casos, elas podem levar a tais conflitos sociais e culturais que sua adoção, em outras circunstâncias benéfica para a sociedade, acaba não ocorrendo. Esta é a mensagem dessa história toda.
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