Futuro sob Ameaça

Jornal O Estado do Maranhão
Não será por não saber o que fazer que não cumprimos no Brasil a obrigação de melhorar nosso sistema educacional. O exemplo da Coréia, apesar das diferenças culturais e sociais, mostra o caminho. É inadiável atender a necessidade de se investir pesadamente na melhoria do ensino básico. Não é o caso de deixar-se de aplicar recursos no superior. Trata-se de corrigir a distorção de destinar mais de 80% dos recursos públicos a este nível de instrução e, as migalhas, ao fundamental. Esse equívoco nos leva a gastar 17 vezes mais com os universitários do que com os demais alunos. Por contraste, a Coréia gasta apenas duas vezes mais e tem 82% de seus jovens na universidade. O Brasil, apenas 18%. Ou seja, gastamos relativamente muito mais do que os coreanos, mas colocamos uma percentagem muito menor no nível superior, com formação de qualidade inferior.
Ora, jamais teremos universidades minimamente habilitadas a satisfazer as necessidades de pesquisa de novas tecnologias, o fator mais importante na história de sucesso dos países hoje com elevado grau de desenvolvimento econômico e populações detentoras de excelentes condições de vida, com sua riqueza distribuída de forma bastante igualitária, se não construirmos um forte alicerce com solidez suficiente para sustentar todo o resto do complexo educacional acima dele.
Como ter boas instituições universitárias se os jovens que nela ingressam trazem na sua formação enormes deficiências que os impedem de serem bons pesquisadores, tornando impossível, como regra geral, o desenvolvimento de bons programas de pesquisa, capazes de dar à nossa economia o mínimo de competitividade nos mercados globalizados? Como aumentar a produtividade dos profissionais de nível médio se eles não dispõem das habilidades mínimas no domínio da expressão verbal, se não lhes foram dadas no básico as oportunidades de aprendizado de conceitos quantitativos rudimentares? Fizemos, é verdade, progressos importantes, quantitativamente, nos últimos anos. Mas, o ensino no Brasil é ainda, reconhecidamente de má qualidade.
A Coréia, como bem mostrou a revista Veja recentemente, pode servir de modelo a muitas nações. Mas, não foi sempre assim. Eu, que nasci aí pela metade do século XX, lembro perfeitamente. Saindo de uma guerra contra a outra Coréia, o país era visto, até o início dos anos sessenta, como uma sociedade pobre, ávida por copiar a tecnologia dos outros, inclusive de seu rival histórico, o Japão. Os brasileiros, na época, tinham uma renda per capita maior do que a dos coreanos. Hoje, não chegamos à metade. Grande parte dessa revolução deveu-se à excelente condição do sistema educacional coreano, obtida por meio do correto direcionamento dos investimentos nessa área. A prioridade foi dada ao ensino fundamental, em que se concentraram os recursos públicos, ficando com a iniciativa privada a tarefa de investir no superior.
A necessária inversão de prioridades nesse campo no Brasil, que deve vir acompanhada de um aumento na percentagem do PIB aplicada na educação e por uma radical reforma universitária, a ser feita no pressuposto de aplicação eficiente dos recursos, encontra forte reação ideológica de alguns setores minoritários, porém influentes e barulhentos. São resquícios, imagino, de nossa mentalidade bacharelesca que só reconhece como nobre a instrução superior, mesmo de baixa ou nenhuma qualidade.
Enquanto isso não for alcançado, enquanto não se der prioridade ao fundamental, permanecerá a pergunta. Se é tão evidente o rumo a tomar, se não se podem construir castelos no ar, por que não aceitamos o desafio ante nós e fazemos nosso dever de casa? Se não agora, quando o faremos? As forças do atraso terão tanta força assim de ameaçar impunemente nosso futuro?

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