O Acordo Ortográfico I

Jornal O Estado do Maranhão


Ano Novo, ortografia nova, que passo a usar hoje. Vigora desde o dia 1º deste mês o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa assinado em 1990 entre os países que têm o português como língua oficial: Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, e Timor Leste. Cada um adotará ritmo próprio na sua implantação. Aqui, em obediência ao decreto assinado pelo presidente Lula em sessão da Academia Brasileira de Letras, a 29 de setembro de 2008, o período de transição irá de 1º de janeiro de 2009 a 31 de dezembro de 2012, e, em Portugal, até 2014. Os signatários deverão elaborar um vocabulário ortográfico comum.
Grandes órgãos da imprensa brasileira – pelo menos a Folha de S. Paulo, desde o dia 1º de janeiro – começam a adotar a nova ortografia. Paradoxalmente, o Executivo Federal e o Congresso Nacional, poderes que a aprovaram, não mexeram uma palha para adotá-la. Felizmente o Supremo Tribunal Federal já o faz.
A ideia de unificação ortográfica entre Brasil e Portugal começou no momento mesmo em que houve a primeira grande reforma, em 1911, adotada em Portugal, quando o país simplificou a escrita, deixando de priorizar a ortografia pseudoetimológica em favor da escrita fonética. A Academia Brasileira de Letras havia feito um experimento em 1907 com a simplificação da escrita nas suas publicações, reformulado em 1912 em função da resposta negativa dos usuários. A tentativa não vingou.
O Brasil não aderiu à iniciativa portuguesa de 1911 e continuou escrevendo farmácia com ph, o que hoje nos parece meio esquisito, mas na época teve ferrenhos defensores. Como hoje em relação à atual reforma, eles argumentavam que nenhuma era necessária.
Do século XIII até meados do século XVI a ortografia do galego-português era predominante fonética. Com o aumento dos estudos humanísticos a partir daí, inverteu-se a tendência e a escrita passou a ser, até o início do século XX, etimológica ou pseudoetimológica. A reforma de 1911, portanto, é como um retorno à ortografia fonética da Idade Média, com aplicação mais uniforme em vista da atuação da Academia de Ciências de Lisboa, fundada no reino de d. Maria I, em 1779.
Em 1915, a ABL novamente tentou promover a unificação, mas voltou atrás em 1919. Em 1929, fez nova tentativa, lançando um novo sistema ortográfico. Não funcionou.
O primeiro Acordo entre Brasil e Portugal foi aprovado em 1931, mas não conseguiu também a desejada unificação. A Constituição do Brasil de 1934 determinou a volta da ortografia vigente até 1891. Houve tão grande resistência que a Constituição do Estado Novo, de 1937, trouxe de volta a de 1931, que de qualquer maneira não havia sido posta em prática. Em 1943, foi celebrada a Convenção Ortográfica entre o Brasil e Portugal. No entanto, a persistente divergência nos Vocabulários das academias dos dois países, levou à Convenção Ortográfica Luso-Brasileira de 1945. Esta, mais uma vez, foi adotada apenas em Portugal, mas não no Brasil. Aqui, em 1971, e em Portugal, em 1973, adotaram-se leis que reduziram as divergências, persistindo, porém, apesar da aproximação, sérias diferenças. O Acordo obtido em 1975 não chegou sequer a ser aprovado oficialmente nem lá nem cá.
O processo continuou no encontro dos países lusófonos, promovido pelo então presidente José Sarney em 1986 no Rio de Janeiro, pela primeira vez com a participação dos países africanos de expressão portuguesa, ocasião em que foi aprovado o Memorando Sobre o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, inviabilizado, todavia, em sua aplicação, pela reação contra ele em Portugal, mas que se tornou a base do atual Acordo. Finalmente em 1990, em reunião em Lisboa, foi aprovado este que acaba de entrar em vigor.
Na próxima semana voltarei ao assunto.

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