Dirigismo Cultural?
Jornal O Estado do Maranhão
Iniciativa do Ministério da Cultura propõe alterações na Lei no. 8.313 (Lei Rouanet), de incentivo à cultura, em vigor desde 23 de dezembro de 1991. A proposta gerou muita polêmica, desde o dia 23 de março deste ano, quando foi divulgada, e, depois, ao ser submetida a consulta pública, até o dia 6 de maio. Passada esta data, o ministro da Cultura iniciou visitas a diversos estados para conversas com os secretários de cultura e pessoas e entidades com atuação na área.
A resistência do Ministério e de gente de mentalidade estatizante à lei de agora, de excelentes resultados, está clara na transcrição, no site do próprio Ministério, de texto do jornal O Povo, do Ceará, estado onde houve discussões sobre o assunto: "O principal objetivo do Ministério com o projeto é que o Estado passe a regular o mecanismo de financiamento da cultura brasileira, hoje feito majoritariamente por meio de renúncia fiscal da iniciativa privada.". Afora a redação imprecisa, pois a renúncia não é da iniciativa privada, mas do poder público, é evidente a ideia de que tudo pode e deve ser regulamentado pelo Estado.
Como atualmente às empresas é dada a opção de aplicar, após prévia aprovação pelo Ministério, em projetos culturais de sua escolha, parte do imposto que teriam de recolher às abarrotadas burras governamentais, então o mecanismo não deve prestar. Quem tem a competência para decidir sobre o melhor para a sociedade são os burocratas. Eu de minha parte, prefiro que as escolhas continuem a ser feitas por elas. O governo é, por sua natureza, um monopolista. O setor privado, quando também o é, tem, como os estudos econômicos nos mostram incessantemente, vida relativamente curta pois monopólios tendem a se esfacelar com o passar do tempo. Mais ainda. Corporações empresariais, há muitas, concorrendo umas com as outras. Governo, só um.
Uma comissão composta, entre outros, por membros da sociedade, segundo a nova lei, ficaria encarregada de aprovar os projetos merecedores de ajuda, procedimento já adotado presentemente, porém em fase anterior à escolha das empresas. Ou seja, estas nos dias atuais já tomam decisões com base em decisões do próprio governo. A diferença na proposta, é que o poder público ficaria com a palavra final. Elas teriam então de aplicar tão somente em determinado projeto indicado pelo Estado e não poderiam escolher em uma lista dos pré-aprovados pelo Ministério, como no presente. E mais, não poderiam fazer divulgação da aplicação. Aí está um bom incentivo, se o objetivo for fazê-las não aplicar nada e recolher sem chateações o imposto ao erário. Aliás, o Ministério deixou claro que o ideal seria ter a totalidade dos recursos para incentivo à cultura administrados por um fundo estatal.
O leitor terá uma noção do caráter estatizante da proposta pelo artigo 49: "O Ministério da Cultura e demais órgãos da Administração Pública Federal poderão dispor dos bens e serviços culturais financiados com recursos públicos para fins não-comerciais e não-onerosos, após o período de três anos de reserva de direitos de utilização sobre a obra". Em palavras mais claras, o governo irá expropriar a propriedade intelectual dos autores dos projetos.
Quanto à concentração na região sul-sudeste da aplicação de recursos, devemos observar que o problema não é da Lei Rouanet, mas da baixa capacidade de aplicação das empresas do restante do país. Seria preciso eliminar as desigualdades regionais do Brasil a fim de eliminar o problema. Também, aplicações nas outras regiões são contabilizadas como da sul-sudeste por nesta se encontrar a maior parte das sedes das aplicadoras.
De qualquer modo, essa tentativa de mudança estatizante levanta um complexo, eterno e, parece, insolúvel problema. O apoio estatal às atividades culturais não levaria a um dirigismo cultural? O fato de o poder público a elas alocar recursos não conduziria a manipulações em favor do príncipe? Essa, a discussão mais importante. Enquanto não se chega a uma conclusão, melhor é continuar com a Lei Rouanet.
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