Festa a bordo

Jornal O Estado do Maranhão

“É nossa intenção que o povo brasileiro seja estimulado a dar sua contribuição ao controle e fiscalização”. Ao se ler a declaração assim, sem menção a quem pronunciou tão belas palavras, pode-se até pensar que foi dada por um militante de uma dessas Ongs que andam por toda parte, não se sabe eleitas por quem, fazendo farra com recursos públicos, transferidos a elas em valores que vêm aumentando de forma exponencial nos últimos anos, levando seus dirigentes se dedicarem com exclusividade ao bem dos brasileiros e dos próprios bolsos.
Quem fez a declaração, contudo, foi o presidente Lula, quando o Portal da Transparência foi lançado em 2005. Outra, de agora, feita por Franklin Martins, ministro da Comunicação Social do mesmo Lula, e ex-presidente da UNE em tempos idos, defendeu os gastos com cartões corporativos do governo, quando surgiu o mais novo escândalo do governo, que os tem como origem. A verdade, porém, é que fizeram a festa, mesmo em sentido literal, pois o uso desse instrumento moderno de pagamento, boa idéia em princípio, foi utilizado na compra, até, de material para festa.
Os gastos, limitados por legislação específica a despesas emergenciais e de pequeno valor, se distribuíram democraticamente por toda a administração federal, cobrindo itens de difícil enquadramento nas exigências da lei. As agências reguladoras devoraram mais de um milhão de reais em 2007, na maior parte em lojas de material de construção, papelarias e supermercados, ou simplificaram as coisas fazendo saques em espécies cuja aplicação pode ser disfarçada de diversas maneiras, nem todas modelo de correção. Em algumas universidades federais, o cartão foi usado em padarias sofisticadas e lojas de artigos para, adivinhem, festa de novo. O ex-scretário executivo e agora titular do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, usou-o no pagamento de um almoço oferecido a companheiros petistas. No Ministério das Comunicações, um funcionário gastou mil e quatrocentos reais na reforma de uma mesa de sinuca, sob a alegação de que o serviço era urgente. Devia ser mesmo, pelo menos do ponto de vista dele, pois a mesa é usada na sua recreação e dos colegas na garagem subterrânea do prédio do Ministério. Como se vê a folia vai dos mais elevados andares ao subsolo.
O máximo de transparência, todavia, foi alcançado com Lula e sua família. Nesse caso, os seguranças da segurança presidencial, sentindo grande insegurança sobre suas reais funções, se esbaldaram em churrascarias e em lojas de departamento e de material de construção. Chegaram a construir e equipar uma academia de ginástica. Em três anos, sacaram trinta e quatro mil reais em caixas eletrônicos.
O governo reagiu logo. Se o cartão estava sendo mal usado, a solução seria esconder a informação, pela sua retirada do site, como na piada em que o marido retira o sofá da sala, a fim de sua mulher não utilizá-lo em seus momentos de intimidade com o amante. Depois, pensando bem, achou melhor demitir um ministro qualquer. E lá se foi a da Igualdade Racial, menos igual do que seus pares, sem influência e importância reais.
Agora se anuncia a proibição do uso dos cartões pelos ministros, porque eles não poderiam ordenar despesas em favor deles mesmos, descoberta tardia. Ótimo, daqui por diante os assessores podem fazer as compras de suas excelências e, se algo der errado, a culpa será só dos subordinados.
A liderança do governo no Senado se apressou em propor uma CPI do Cartão, abrangendo o período 1998-2008, que inclui o governo de Fernando Henrique Cardoso. É para não dar certo.
E assim o barco navega, com sua pesada carga de vícios radicais, sem bússola nem GPS, mas com marinheiros cheios de dinheiro alheio, em suas roupas de pirata, felizes da vida.
Amém.

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