As agências e "a gente"

Jornal O Estado do Maranhão
O presente caos brasileiro, explícito depois do desastre do Airbus da TAM que matou quase 200 pessoas e mostrou completa falta de coordenação entre órgãos encarregados do setor aéreo brasileiro, trouxe a debate público o papel das agências reguladoras no Brasil. O governo, depois de desvirtuá-las, enchendo-as de companheiros ansiosos por mostrar seus conhecimentos especializados em capturar bons empregos públicos e que, no caso da de Aviação Civil, Anac, de vôo de avião entendem tanto quanto eu do idioma mandarim, quer agora politizá-las, atribuindo ao Executivo o poder de demitir seus diretores. Querem matá-las, jogando fora juntos o bebê e a água do banho.
Preservadas de politicagem nos países desenvolvidos, elas desempenham, livres de interferências perniciosas dos governos, papel importante na economia. Seus diretores, aprovados pelo Legislativo, têm mandatos fixos, não coincidentes como o do presidente da República, que não os pode demitir, e trabalham com a independência necessária a entidades reguladoras e fiscalizadoras de mercados. Só assim têm a possibilidade de fazer estes funcionarem de maneira adequada, dadas suas características estruturais.
Nossa aviação não-regional possui apenas duas empresas, a TAM e a Gol. Constitui, por conseguinte, mercado duopolista. No entanto, a Anac, corrompida pelo lulo-petismo, foi transformada em órgão de afago das companhias e não, como deveria por imposição legal, de regulação e fiscalização. Tem entre seus dirigentes pessoas ligadas às duas e muito contribuiu para o desastre do aeroporto de Congonhas. Hoje, seis das dez agências são presididas por filiados ao PT ou ao PC do B, partidos da base aliada do governo. Outros nove diretores são ou foram filiados a outros partidos.
De outra parte, por contingenciamento de recursos de um monte de outros órgãos que batem cabeça na área, investimentos indispensáveis não foram feitos nas pistas dos aeroportos e na modernização dos obsoletos sistemas de controle de tráfego. Nas estações de passageiros, sim.
Decorre de compreensão distorcida ou até de completo desconhecimento dos mecanismos da economia de mercado grande parte da inércia oficial. Assim como há um marxismo vulgar, existe um liberalismo vulgar e apressado, seguido pelos companheiros do PT no governo, a cujas virtudes capitalistas selvagens, aderiram com alegria a toque de caixa registradora. Recém-convertidos, parecem acreditar que as regras do mercado são licenças para lutas hobbesianas, vale-tudo morais na arena econômica.
Não se deve colocar dúvidas sobre a busca do auto-interesse no jogo do mercado, dentro da lei, como responsável pela criação da riqueza das nações. No entanto, não basta isso. A ética é fator de produção tão importante quanto qualquer outro porque a qualidade dos jogadores, isto é, sua aderência ou não a princípios éticos, afeta as próprias regras do jogo econômico. Jogadores ruins produzirão regras ruins, deteriorando o desempenho da economia. Isto acontece aqui, a começar pelo nosso pernicioso jeitinho. O combate à corrupção florescente na ausência desses princípios, é, portanto, não apenas uma questão de moralismo pequeno-burguês, mas um requisito essencial à prosperidade nacional.
A tentativa de enfraquecimento das agências reguladoras tem origem em correntes petistas opostas: uma, oficialista, acredita no capitalismo aético, sem freios e, em especial, sem órgãos de regulação e fiscalização autônomos, isentos de pressões políticas ilegítimas; outra, formada de opositores de dentro do próprio PT, incensa o estatismo desvairado e corrupto. A depender do atraso cultural delas, a prosperidade nacional estará longe do Brasil por muito tempo ainda.
No linguajar companheiro: “a gente” precisa das agências.

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